Home » , , , , » Relacionamento aberto não é bagunça e também tem regras

Relacionamento aberto não é bagunça e também tem regras

Apesar de um relacionamento aberto permitir relações extraconjugais, não quer dizer que vale tudo


Achar que os relacionamentos tidos como abertos são totalmente liberais é mais um entre os diversos mitos que rondam a sexualidade. É claro que existem exceções, mas, a grosso modo, eles também têm suas normas, explícitas ou não.

"As relações abertas contam com regras diferentes das usuais, por isso soam como se fossem liberais. Na prática, não é bem assim", afirma o terapeuta sexual Oswaldo Rodrigues Jr., diretor do Inpasex (Instituto Paulista de Sexualidade Humana).

Embora permitir que o outro transe com outras pessoas seja o fundamento básico desse tipo de relacionamento, isso não significa que vale tudo na cama (ou fora dela).

Para Oswaldo, antes de o casal conversar sobre regras, é necessário que ambos saibam exatamente quais são seus desejos, necessidades e limites individuais. Só assim poderão conceber o que podem ou não fazer com outras pessoas.


"Estamos juntos há dez anos, mas não somos oficialmente casados. Sempre tive essa alma mais aberta. Já a Fada vem de uma família italiana e católica, com a cabeça mais fechada. Comecei a fazer com que ela raciocinasse de forma diferente. Ela não queria abrir a relação porque não se sentia atraída por outros caras. Mas ela sacou que gostava de mulher. Adorei. Isso foi há seis anos, depois do nascimento da nossa segunda filha, a Mônica", Ricardo Kilian (Bardo), 30, parceiro de Vanessa Tiburski (Fada), 29. O casal forma a banda Bardoefada em Porto Alegre, Rio Grande do Sul.

O terapeuta diz, ainda, que existem dois tipos de casais "abertos": o que têm consciência das próprias fantasias e vontades e aquele que acha que é liberal e, ao longo do tempo, percebe que não estabeleceram os limites que deveriam seguir.

Como os parceiros do primeiro casal se conhecem bem, dificilmente viverão uma relação que os agrida emocionalmente. "O segundo par, por outro lado, pode entrar em esquemas destrutivos toda vez que enfrentar situações cujas regras não foram estabelecidas anteriormente", conta Oswaldo.



Com preservativo e sem envolvimento
De acordo com a psicóloga e terapeuta sexual Carla Cecarello, presidente da ABS (Associação Brasileira de Sexualidade), o princípio básico de quem pratica sexo casual fora de casa é usar preservativo nas relações extraconjugais.

"Isso dá garantias de que a pessoa se cuida, se protege e, em consequência, protege a parceria", explica. Alguns casais, confiantes nesse pacto, costumam dispensar maiores cuidados quando transam entre si, o que é um risco. Mas exames frequentes para detecção de enfermidades –em especial DSTs (doenças sexualmente transmissíveis)– fazem parte da rotina de muitos adeptos.

Outra regra habitual é restringir as aventuras ao âmbito sexual. "Isso é combinado justamente para não se correr o risco de envolvimento amoroso e, assim, a parceria de relacionamento aberto acabar", fala Carla. Caso algum interesse além do sexual seja despertado, é comum comunicar ao outro o que está acontecendo e, em seguida, se afastar de quem parece ser uma nova paixão.



"Os Sonhadores", de Bernardo Bertolucci (que também dirigiu "O Último Tango em Paris"), aborda um tema polêmico com delicadeza: o triângulo amoroso formado por um casal de irmãos franceses e um amigo americano. Como pano de fundo, a Paris do fim da década de 1960 e o fervilhante clima do movimento estudantil. "É uma história densa que, com Bertolucci, fica poética e sensual", define Carol Teixeira, autora do blog A Obscena Senhorita C. Reprodução

A possibilidade do surgimento de um rival no plano afetivo é o principal fantasma que aterroriza as relações abertas. Por conta disso, muitos praticantes definem que só podem fazer sexo com determinada pessoa se o parceiro aprovar antes. Seguindo a mesma lógica, costumam ser vetados amigos ou conhecidos.

"Vários homens e mulheres, porém, fazem exigências ainda mais específicas, como permitir transas somente fora da cidade ou em viagens, proibir beijos na boca ou sexo oral e jamais repetir amantes", declara a terapeuta sexual Valéria Walfrido.

Contar ou não em detalhes tudo o que aconteceu e dar um espaço de um ou dois dias para fazer amor com o parceiro fixo são outras determinações que costumam ser combinadas.


Oswaldo Rodrigues diz que outra norma importante é não permitir que o estilo de vida se torne conhecido entre filhos, amigos ou familiares. "A tendência é formar novos círculos sociais que aceitem ou participem do relacionamento aberto", responde o especialista.

A terapeuta sexual Valéria Walfrido lembra que qualquer relação –profissional, familiar, pessoal, sentimental– costuma ser pontuada por regras. No entanto, as emoções costumam confundi-las ou até mesmo quebrá-las. Por isso, mesmo o mais organizado e bem resolvido dos casamentos abertos não está imune às crises.

"Regras são feitas para serem cumpridas, porém, podem e devem ser mudadas a partir do momento que não sejam satisfatórias para um dos lados. Afinal, a relação ainda é a dois, mesmo com visitantes esporádicos. Se uma das partes começa a fazer sacrifícios constantes, a união sofre um desequilíbrio e requer ajustes", declara.

Apesar de a fidelidade ser um conceito bastante flexível nesse modo de viver, é preciso estar preparado para um imprevisto: nenhuma regra é capaz de conter o resultado de uma química sexual avassaladora ou a descoberta de um novo amor.